Sem ter medo de me equivocar, posso afirmar que o rugby é antes de tudo, um esporte. Entretanto, com o passar do tempo, na medida em que foi crescendo e evoluindo, nosso jogo agregou algumas facetas adicionais.
Na verdade, hoje o rugby não é só um divertimento, mas também um espetáculo para as multidões e um suculento negócio.
Basta observar os ganhos econômicos gerados no último mundial disputado na França para afirmar que o rugby é um produto cada vez mais desejado.
Inclusive, poderíamos ampliar ainda mais seu campo de ação, porque nosso querido esporte volta a sentir o orgulho de ser uma disciplina olímpica. Um elo a mais para um esporte com caráter de várias faces.
Por outro lado, mais além dos valores e das opiniões diversas que se tenha a respeito do jogo, existe um consenso de que o rugby é - e sempre foi - uma ferramenta transformadora.
Quer dizer, um meio inigualável que – bem utilizado – está em condições de mudar a vida das pessoas.
Esse caráter peculiar por excelência é o que faz do jogo do rugby um esporte absolutamente único.
Esse elemento adicional e distintivo é o que podemos relacionar com o “espírito do jogo”. E esse espírito forma parte importante de sua essência porque o rugby esteve desde sempre ligado a seu lado formativo.
Já nos seus primórdios, foi idealizado como instrumento para ordenar e guiar a vida dos jovens.
Aquela monumental obra criada por Thomas Arnold, diretor da Escola de Rugby, foi concebida como um meio eficaz para formar pessoas, como um instrumento idôneo para obter disciplina a centenas de alunos ingleses propensos ao descontrole e à falta de limites até então.
Através de seu espírito, o rugby consegue chegar a sua essência como esporte.
O espírito do jogo o enaltece e eleva-o sobre os demais dentro do amplo universo do esporte.
Preservar seu espírito é transcendental, porque está claro que um rugby órfão de valores e princípios filosóficos não serve como ferramenta transformadora.
O rugby excede o que significa o jogo em si mesmo porque o rugby é sua regra, mas também seu espírito.
Esse espírito, que guardado e transmitido de geração em geração, conseguiu manter sua essência até nossos dias. É uma tarefa e um compromisso de todos respeitar sua filosofia para que ele siga perdurando através do tempo.
Pretender separar o que diz especificamente ao jogo, do que significa seu espírito, pode nos conduzir a um engano, porque o espírito do jogo e seus princípios fundamentais se formam a partir das características particulares que apresenta o rugby.
Ambos os conceitos estão interconectados e não se pode entender um sem o outro. Sem espírito seria impossível jogá-lo, e sem suas regras e características particulares, não se teria criado esse espírito para praticá-lo.
Se é algo difícil precisar e definir a palavra “espírito”, eu poderia dizer, sem medo de me equivocar, que o “espírito do jogo” é a chama que ilumina o caminho do rugby.
É o candelabro que guia nosso esporte através do passar do tempo, ou um tipo de bússola que conduz as novas gerações a um porto seguro a fim de que não percam o rumo.
No rugby, o espírito é a letra não escrita. É esse código de conduta que não precisa editar nem publicar, porque foi transmitido por milhões em geração pós geração através dos usos e costumes. Não podemos vê-lo, mas sabemos que existe e está sempre presente.
No rugby o espírito reflete lealdade, correção e cavalheirismo; transluz fidalguia e grandeza na vitória, e também correção e bons modos na derrota.
O espírito do jogo é solidariedade, entrega sem limites e compromisso.
Muitos haverão de perguntar onde se encontra o espírito do rugby e seguramente várias respostas se rão disparadas de forma quase imediata.
É possível que alguns, exprimindo argumentos convincentes, indiquem que o espírito do rugby está só “em campo” e outros possivelmente dirão que unicamente está presente durante o “terceiro tempo”.
Sem querer polemizar me atrevo a sugerir que o espírito do jogo está em todos e cada um dos rincões onde se respira rugby.
Está em campo, porque seria impossível praticá-lo se não estivesse sempre presente, mas também fora dele. Transcende e ultrapassa os perímetros de um estádio e se mostra guardado em cada esquina onde se respira rugby.
Na verdade, não se extingue dentro dos perímetros de um estádio, mas recorre a cada lugar onde o rugby é motivo de encontro: terceiro tempo, vestiários, reuniões, conversas informais e festas de camaradagem.
Está claro que o rugby se vê enriquecido pelas enormes diferenças entre seus países-membros.
Mais de três milhões de jogadores espalhados em cento e dezessete países outorgam ao jogo uma amplitude e uma diversidade nunca antes observada. Não obstante, essas diferenças externas em sua essência não são tais.
O porte e a potência física dos sul-africanos, a técnica apurada dos australianos, a imprevisibilidade dos franceses, o temperamento e a garra dos argentinos, a paixão dos irlandeses, a veemência dos samoanos, a plasticidade dos fijianos, a velocidade dos quenianos ou a bravura dos neozelandeses conseguem sintetizar e se confundir em um só fio condutor: o Espírito do Jogo.
O espírito não reconhece diferenças nem repara as latitudes, raças ou nacionalidades. É um só e equipara a todos fazendo-os absolutamente iguais.
Esse denominador comum possibilita que mais além da língua de cada equipe, os jogadores se entendam e consigam falar “o mesmo idioma”.
O espírito é essa porção mágica de entendimento, que permite encurtar distâncias, romper barreiras e colocar a toda a família do rugby em uma só e mesma direção. Conservar, preservar e respeitar esse espírito é uma obra e uma tarefa de todos e cada um de nós...
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